Outro dia vi na televisão um debate sobre óvnis onde, pela milésima vez, um fã dos discos voadores levantou o seguinte argumento: “Mas você acha mesmo que estamos sozinhos no universo?” E, pela milésima vez, fiquei decepcionado ao ver que nenhum dos outros debatedores, em vez de balançar a cabeça diante da gravidade da pergunta, dava a resposta lógica: “E daí?”
Explico. É um fato inegável que óvnis – objetos voadores não-identificados – existem. Você olha para o céu, vê uma coisa voando, não consegue identificá-la: eis aí um óvni. Também é inegável que, num universo como o nosso, onde novos planetas são descobertos quase diariamente e algumas das moléculas fundamentais da vida flutuam pelo espaço e caem do céu em meteoritos, a probabilidade de a biosfera terrestre ser única é ridiculamente baixa. Meu “e daí?” apenas busca evidenciar que não há nenhuma ligação lógica entre as duas coisas.
De 95% a 99% de todos os óvnis investigados acabam tendo algum tipo de explicação mundana – são planetas, estrelas, balões, aviões, nuvens, pássaros, satélites, meteoritos, alucinações, fraudes. Para dar conta do resíduo de casos inexplicados, algumas pessoas propõem a chamada “hipótese extraterrestre”: esses objetos seriam naves tripuladas por seres inteligentes vindos do espaço.
Mas há vários problemas com essa hipótese. O primeiro é a falta de evidências: se tudo o que você tem para apresentar é uma luz esquisita no céu, qual sua base para afirmar que se trata de uma nave extraterrestre e não (digamos) da carruagem celeste do deus Thor ou, mesmo, de um fenômeno natural obscuro? Quando o único ponto de partida é a ignorância – o objeto em questão é “não-identificado”, lembre-se – hipóteses podem ser multiplicadas ao infinito, sem nada que permita escolher uma no lugar da outra.
Uma peneira clássica, nessa hora, é a da plausibilidade: mesmo na ausência de evidências, algumas hipóteses podem ter mais chance de ser verdade que outras. É aí que a cartada do “sozinhos no universo” entra: se não estamos sós, vai o raciocínio, então a hipótese de visitantes extraterrestres torna-se um pouco mais plausível.
Mas o ganho é ilusório. Ele depende, crucialmente, de uma cadeia de premissas ocultas, cada uma menos plausível que a outra, a saber: que “vida” implica “vida inteligente”; que “vida inteligente” implica “tecnologia avançada”; que “tecnologia avançada” implica “viagem interestelar” – e que, numa galáxia de 100 bilhões de estrelas, “viagem interestelar” implica “dar uma passadinha na Terra e ser observado, sob a forma de uma luz esquisita, pelos nativos”.
A ideia de que a evolução da vida leva inevitavelmente à inteligência, de que a inteligência leva à tecnologia e a tecnologia, ao espaço, não passa de um preconceito antropocêntrico – na verdade, ocidental – a que fomos habituados pela ficção científica. Mas a vida lá fora, se houver, pode ser toda feita de bactérias, ou de toupeiras filósofas que só querem saber de cavar túneis. Ou, em geral, de criaturas que têm mais a fazer do que gratificar a vaidade humana.
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Carlos Orsi
galileu
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