Os vaivéns de suas falas na área econômica, seara que o presidente já admitiu mais de uma vez que pouco entende, ocorrem principalmente por conta de um aperto orçamentário para 2020. Há ministério que sofrerá cortes de até 58%. E uma brusca redução dos investimentos públicos.
Na Câmara tramita uma proposta de emenda constitucional (a de número 438/2018)
que reduz os valores de repasses constitucionais e que afunila a margem
de manobra do Governo diante da tarefa de decidir onde e quanto deve
ser investido. A dúvida é se em algum momento essa conta vai conseguir
fechar.
Desde 2014, os investimentos do Governo federal
vêm sofrendo seguidas quedas. Naquele ano, a União investiu 99 bilhões
de reais. Caiu para 50 bilhões de reais em 2019. E o projeto de lei
orçamentária anual enviado na última semana ao Congresso Nacional mostra
que a previsão é que no próximo ano invista 19 bilhões de reais. Uma
queda de 80% em seis anos. Especialistas dizem que há um claro risco do
Brasil ser obrigado a paralisar serviços em 2020 numa espécie de
colapso, ou shutdown, como ficou conhecida a expressão nos Estados Unidos quando o Congresso não valida o orçamento do Governo.
Outro
fator que influenciou na mudança de discurso do presidente foram
queixas diretas do seu ministro da Economia, Paulo Guedes, e as
declarações do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo,
Maia afirmou que “abrir o teto” não é tratar do problema. “É você
esconder o problema, aumentar a despesa, aumentar o endividamento e
gerar uma nova crise no futuro. É por isso que tem que manter o teto”.
A
atual encruzilhada se dá, principalmente, porque cerca de 94% do
orçamento da União é vinculado às despesas obrigatórias – como salários e
aposentadorias, pagamento da dívida pública e transferências
constitucionais – e apenas 6% às discricionárias – como investimentos em
obras públicas, financiamento de pesquisas, manutenção de prédios
públicos, modernização de hospitais e universidades.
A
regra do teto, criada em 2016, prevê que o Governo não pode registrar
despesas superiores às que teve no ano anterior somadas à inflação dos
últimos 12 meses. Quando foi aprovada, foi apontada por alguns dos
especialistas como uma das soluções para colocar o país nos rumos do
crescimento. Enquanto outros a viam exatamente ao contrário, a
classificavam como uma barreira que impediria qualquer investimento
público e reduziria a arrecadação. Essa corrente entende que o governo
tem de ser propulsor dos investimentos na economia. E somente a partir
dos seus estímulos, a economia reage. Dessa maneira, aumenta o
faturamento das empresas, elevando a arrecadação pública.
“O
teto de gastos é um instrumento extremamente importante para acabar com
a trajetória declinante da despesa obrigatória”, avaliou o consultor de
orçamento da Câmara dos Deputados Hélio Martins Tollini. O professor da
Universidade de Brasília, Roberto Piscitelli, avalia que esse princípio
seria quebrado em algum momento porque o teto travaria o investimento
público, frearia os financiamentos em pesquisas e a própria manutenção
da máquina. “Não esperava que essa flexibilização pudesse ocorrer tão
cedo”, ponderou. Para Piscitelli, a própria limitação de gastos já tem
feito com que algumas atividades sejam paralisadas e a tendência é que
sigam assim, caso nada seja feito.
Pela lei, a previsão
de revisão só poderia ocorrer em 2026. Antes, qualquer mudança tem de
acontecer mediante alterações legislativas por meio de uma emenda
constitucional. Para evitar a alteração no teto de gastos, o consultor
Tollini entende que a única alternativa seria reduzir a despesa
obrigatória. E essa alteração só ocorreria mediante mudanças
legislativas.
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Afonso Benites
Brasília
El País
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