Juan Guaidó está determinado a levar até o fim seu desafio a Nicolás Maduro. O político que há um mês se propôs a acabar com duas décadas de chavismo deixou Caracas nesta quinta-feira para receber os carregamentos de ajuda humanitária que amanhã pretende fazer entrar na Venezuela pela fronteira com a Colômbia. Um dispositivo de voluntários tentará forçar a entrada — com o apoio logístico da agência de cooperação dos EUA — de cerca de 300 toneladas de material médico e alimentos. Depois de rejeitar a necessidade de ajuda, o Governo de Maduro abriu a porta para o recebimento de remédios através da União Europeia.
A viagem de Guaidó é, portanto, um elemento determinante
nesse clima de tensão máxima. Foi anunciada na quinta-feira à noite,
depois de dias de suspense. A caravana, composta por dezenas de veículos
com dirigentes parlamentares, assessores e alguns com voluntários,
deixou a capital de forma desordenada ao longo da manhã, em meio a uma
nebulosa de informações contraditórias fornecidas por sua própria
equipe. Entre Caracas e San Antonio del Táchira são quase 800
quilômetros, o que é um trajeto de pelo menos 10 horas, sem contar os
frequentes controles das forças de segurança.
Seu objetivo era driblar os agentes da Guarda Nacional
Bolivariana e chegar à fronteira, razão pela qual seus colaboradores
evitaram dar informações precisas durante o trajeto. Ao aberto desafio
ao Governo também se soma a circunstância de que uma das medidas
cautelares impostas ao dirigente pelo Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) é
a proibição de sair da Venezuela. Com essas premissas, a possibilidade de que Guaidó entre na Colômbia
ainda é uma incógnita. Ao mesmo tempo, ainda não há clareza sobre os
detalhes do dispositivo que busca a entrada da ajuda a partir de amanhã.
“Desde San Antonio del Táchira está sendo feito um esforço
importante para proteger a vida dos venezuelanos e organizar a entrada
da ajuda humanitária”, limitou-se a dizer Guaidó através de redes sociais
antes da viagem. “Hoje a entrada da ajuda humanitária é iminente e
impossível de conter. Somos milhões que queremos uma mudança na
Venezuela e este é o primeiro passo”, disse o deputado Miguel Pizarro,
presidente da comissão especial responsável pelo monitoramento das
entregas.
A partir de hoje o município colombiano de Cúcuta e o
venezuelano de San Antonio del Táchira serão, antes de mais nada, o
cenário de uma batalha entre a chamada comunidade internacional — à qual
nesta quinta-feira se juntou a Igreja Católica, através da Conferência
Episcopal da Venezuela — e o chavismo. Haverá dois eventos musicais.
Um para exigir a entrada da ajuda, dirigida em uma primeira fase a
mulheres grávidas e menores de três anos, e outro para agitar o fantasma
de uma intervenção militar.
Guerra psicológica
Apesar de rejeitar essa ajuda, o Governo de Maduro reconheceu sua necessidade depois de tê-la negado reiteradamente. A vice-presidenta executiva, Delcy Rodríguez, disse que entregará uma lista de medicamentos para “assistência técnico-humanitária através da ONU, que a UE pode proporcionar”. Essa possibilidade busca a cumplicidade de Bruxelas frente a Washington e faz parte de uma estratégia que tenta reduzir a pressão. “Mesmo que eles não tenham essa capacidade [de oferecê-la grátis], a Venezuela está disposta a cancelar [PAGAR] essa assistência”, acrescentou.
De um lado e do outro, todos buscam o mesmo: o apoio das
Forças Armadas. Guaidó tenta há semanas convencer a cúpula militar, os
oficiais e os soldados, que em última instância terão de decidir se
deixam entrar os carregamentos. Busca uma divisão no seio das Forças
Armadas Nacionais Bolivarianas (FANB), essencial para alcançar o poder
na Venezuela.
Hugo Carvajal, o maior general do Exército venezuelano,
figura de linha de frente nas Forças Armadas e agora aposentado do
chavismo, reconheceu nesta quinta-feira Guaidó como o presidente
legítimo do país e pediu aos soldados que ajam para restaurar a
democracia. "Depende de vocês, irmãos de armas, a maneira em que tudo
isso acaba", afirmou o ex-militar em um vídeo divulgado nas redes
sociais.
No entanto, apesar das deserções pingarem num ritmo mais ou
menos constante, o presidente do Parlamento ainda não garantiu o seu
apoio. Enquanto isso, Maduro e seu Governo, cada vez mais isolados no
tabuleiro internacional, se empenham em mostrar, na imensa maioria dos
eventos públicos, o apoio dos militares à causa chavista.
“Eles estão aplicando o manual da guerra psicológica para
enfraquecer nosso país, nosso Estado, nosso povo e nossa FANB, porque
subestimam a preparação, a firmeza moral e o caráter bolivariano dos
militares venezuelanos”, afirmou Maduro, que foi mais longe ao se
dirigir às Forças Armadas da Colômbia. “Faço um chamado às forças
militares da Colômbia”, disse o presidente, “para que levantem sua voz
contra Iván Duque, que quer levá-las a uma guerra.”
conteúdo
Francesco Manetto
Caracas
El País
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