Primeiro a
boa notícia: o Brasil não é um país no qual o suicídio é comum. Somos
apenas a 113ª nação no ranking das mortes auto-infligidas – e com uma
taxa 5 vezes menor do que o campeão, a Guiana. Agora a notícia não tão
boa assim: o suicídio está crescendo por aqui. Dos 172 países que enviam
dados à Organização Mundial da Saúde, somente 28 registraram aumento
nos índices de suicídio nos últimos anos. E nós somos um deles: a oitava
nação com mais casos em termos absolutos.
Nossa taxa subiu 60% desde
1980 e contabilizamos 11.821 mortes no último levantamento global em
2012. Se incluirmos as mortes não declaradas na conta, a perspectiva é
ainda pior com 30% mais casos e tudo indica que continuaremos subindo no ranking. Mas por quê?
“O
Brasil é uma sociedade em ebulição. E sabemos que os números de suicídio
aumentam em sociedades com crise política e econômica”, diz o
psiquiatra Neury Botega, professor do Departamento de Psicologia Médica e
Psiquiatria da Unicamp, um dos maiores especialistas no assunto. “Foi
assim nos países da antiga União Soviética antes da implosão do
comunismo. E tem sido assim no Brasil”, completa.
Se a
crise econômica que assola o país com mais força desde 2015 parece ser
um fator recente, a pobreza não é. O suicídio tem uma forte correlação
com a pobreza: 75% das mortes por ocorre em países de baixa e média
renda. Dentro do Brasil, acontece o mesmo: os estados que mais
registraram aumento de casos estão no Norte e Nordeste – regiões com os
maiores índices de pobreza do país.
Às
margens do Rio Negro, a 850 km de Manaus, fica São Gabriel da Cachoeira
(AM), a cidade onde mais pessoas se matam no Brasil. O município, de
maioria indígena, tem um índice de 51,2 suicídios para cada 100 mil, um
claro exemplo da vulnerabilidade dessa parcela da população.
Índios
apresentam de duas a sete vezes mais chances de cometer suicídio que
outros brasileiros: locais de assentamento de comunidades indígenas têm
as maiores taxas do Brasil. O ato não se explica com um motivo singular,
mas uma soma de fatores que, no caso, incluem conflitos relacionados à
demarcação de terras, perda da identidade cultural e falta de acesso à
saúde mental.
Na ponta
do país, outro gargalo: agricultores no Rio Grande do Sul. “O histórico
de suicídios em famílias alemãs, a forma como a monocultura do tabaco
vinculado a monopólios industriais ocorre em pequenas propriedades
familiares, a depressão ligada ao uso de agrotóxicos, a baixa
escolaridade, o endividamento, abuso de álcool, a maior incidência de
transtornos mentais e a defesa da honra em uma cultura patriarcal são
algumas das condições estudadas”, afirma Botega em seu livro Crise Suicida.
Não à
toa, Três Passos (RS) e Três de Maio (RS), municípios cuja principal
atividade econômica é a agricultura, estão entre as cinco cidades com os
índices de suicídio mais altos do Brasil. Todas da lista têm menos de
40 mil habitantes, o que confirma que o aumento dos casos em cidades
médias e pequenas e alerta para a necessidade de prevenção nesses
lugares.
Assim, há um fator que, infelizmente,
consegue prever a ocorrência desse tipo de morte: a fragilidade social.
Além dos povos indígenas e de pequenos agricultores, presidiários e
moradores de rua também têm de 2 a 7 vezes mais probabilidade de se
matar.
O mesmo acontece com gays e bissexuais,
cujas taxas de suicídio são 5 vezes maior do que no restante da
população. Enquanto essas pessoas continuarem sofrendo preconceito e não
tiverem acesso aos métodos de prevenção – como acompanhamento
psicológico e psiquiátrico – nada indica que nossas taxas vão parar de
subir.
Pâmela Carbonari
super
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