Não há nada errado com a expressão “dois pesos e duas medidas”, que denuncia, como se sabe, uma injustiça e uma desonestidade – o julgamento de atos semelhantes segundo critérios diversos, conforme seus autores sejam mais ou menos simpáticos a quem julga.
Essa é sem dúvida a forma clássica da expressão, que tem origem bíblica e é empregada em diversas línguas: em inglês, para citar apenas um exemplo, fala-se em two weights and two measures.
As críticas que Araújo afirma encontrar à expressão, e que de fato circulam há algum tempo, são fruto da sabichonice que costuma turvar os debates sobre a língua. Segundo tal corrente, a expressão correta seria “um peso e duas medidas”, pois só esta enfatiza o fato de estarmos diante de um mesmo mérito (um peso) e dois julgamentos diferentes.
Tomado isoladamente, o argumento até faz sentido, mas em termos históricos é um equívoco. A expressão não se refere a duas medições para o mesmo peso, mas a dois pesos e dois metros, artimanhas de comerciante desonesto.
Muita gente boa acaba enganada em sua boa-fé por invenções desse tipo. Como aquela outra, sabe-se lá baseada em quê, segundo a qual o ditado correto é “Quem tem boca vaia Roma” – e não “Quem tem boca vai a Roma”.
No caso presente, faltou combinar com a Bíblia, onde se lê, no Deuteronômio (25:13-16), a passagem que deu origem a “dois pesos e duas medidas”:
Não carregueis convosco dois pesos, um pesado e o outro leve, nem tenhais à mão duas medidas, uma longa e uma curta. Usai apenas um peso, um peso honesto e franco, e uma medida, uma medida honesta e franca, para que vivais longamente na terra que Deus vosso Senhor vos deu. Pesos desonestos e medidas desonestas são uma abominação para Deus vosso Senhor.
Sérgio Rodrigues
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