O ex-presidente Fernando Henrique
Cardoso insinuou recentemente em entrevista que a presidenta Dilma
Rousseff "vendeu a alma ao diabo" e terá que "fazer pacto com o demônio o
tempo todo" para poder governar. Em ambas as metáforas, FHC refere-se
ao PMDB.
É oportuno lembrar ao
entrevistado, e também aos leitores que tenham tomado conhecimento da
declaração de FHC, que o PMDB foi seu aliado nos dois governos tucanos
sem que o então presidente jamais demonizasse as alianças construídas.
Renan Calheiros foi seu ministro da Justiça. Eliseu Padilha esteve à
frente da pasta dos Transportes. Geddel Vieira Lima foi seu líder na
Câmara dos Deputados.
Sobretudo, é oportuno lembrar que o
PMDB não é apenas um aliado da presidenta Dilma, mas a legenda do
vice-presidente Michel Temer. Em outras palavras, o PMDB não está no
governo; ele é governo.
Mesmo que a aliança com o PMDB não
tivesse sido sacramentada nas urnas, é o próprio FHC quem reconhece, na
referida entrevista, a necessidade das alianças. “Temos um sistema
partidário e eleitoral que tornou inviável construir maiorias sólidas no
Congresso”, diz ele. “Qualquer um terá esse problema para governar.”
Nesse sentido, eu apenas complementaria a análise dizendo que o
essencial é que essa maioria seja construída de forma ética,
transparente e republicana, como Dilma tem feito, e não valendo-se de
subterfúgios e expedientes ilícitos.
O que parece justificar o tom do
ex-presidente é a evidência de que o governo está no caminho certo para
recompor sua base, como mostra a importante vitória na votação dos vetos
das emendas, antes mesmo de fazer a reforma ministerial. A postura do
PSDB na ocasião foi reveladora do isolamento do partido. Nada menos do
que 50 dos 51 deputados tucanos votaram pela derrubada dos vetos,
convencidos da estratégia do "quanto pior, melhor". Neste momento,
derrubar os vetos e insistir no aumento de despesas seria um gesto
irresponsável, onerando sobremaneira o erário e inviabilizando
investimentos imprescindíveis para o país. Atitudes como essa nos
convencem de que o PSDB deixou de ser o maior partido de oposição do
Brasil para se tornar o maior partido de oposição ao Brasil.
Curiosamente, dias após a votação
que evidenciou o objetivo tucano de rifar o futuro do país em favor da
desidratação do PT, FHC usou o espaço da entrevista para cobrar do
governo federal um "pacto" no qual, segundo ele, Dilma não pense em
"vantagens para seu grupo político, só no futuro do país”. Quem coteja a
entrevista com as reportagens que abordaram o gesto dos tucanos na
votação dos vetos percebe a incoerência entre teoria e prática.
Hoje, é mais do que evidente que
os deputados que de fato pensam no futuro do país são aqueles que
reconhecem a necessidade de economizar. E certamente não são esses que
merecem a alcunha de "diabo" ou "demônio".
Finalmente, a entrevista foi
também reveladora da posição de FHC ao lado dos golpistas. Em certo
trecho, o ex-presidente admite que as manobras para justificar um
hipotético impeachment da presidenta são meramente políticas, erigidas
no plano do discurso. “O impeachment depende de você ter uma
argumentação convincente, não só para o Congresso, mas para o povo”, ele
afirma. Ora, FHC sabe muito bem que é preciso ter base jurídica e
provas contra o mandatário para que um impedimento seja votado. Contra
Dilma, não há nada.
Paulo Teixeira
Brasil 247
Nenhum comentário:
Postar um comentário