Cuidado, demagogos: o povo não é bobo



Crise econômica, crise política, crise moral. Impeachment, renúncia, golpe. Nos meios políticos, e naqueles que acompanham a vida política do país, é no que se fala. O que mais se pergunta é qual a saída para a gravíssima situação em que está o Brasil. Há os que defendem o imediato afastamento da presidente Dilma, por um meio ou por outro. No lugar dela, alguns querem o vice-presidente Michel Temer, outros pregam a realização de novas eleições. Mas, para eleger quem? E há, claro, os que defendem a permanência de Dilma e, dentre esses, os que ainda sonham com Lula na presidência em 2018.
Poucos, porém, têm mostrado que estão entendendo o momento que vive o país. Parece que estão em outro mundo, talvez outro planeta – porque não veem também o que acontece na Europa, em países vizinhos, no México. Não têm dimensão da crise, nem pela vertente econômica, nem pelo lado político. Não entendem que a velha política está falindo, que não dá mais para privatizar à vontade o dinheiro público, que os tempos estão mudando. Devagar, é verdade, mas estão.
Esses alienados deveriam ler a entrevista que Renato Meirelles, presidente do instituto de pesquisas Data Popular, deu ao Correio Braziliense. Meirelles conhece bem o sentimento da população, pelo conjunto de pesquisas que realiza há anos, especialmente nas classes C, D e E. E o que ele conclui é simples: o povo brasileiro não vê nem no governo nem na oposição a capacidade de superar a crise. O povo não acredita mais em políticos.

“A maior crise que existe no Brasil hoje é de perspectiva”, disse Meirelles à repórter Juliana Cipriani. “Nem o governo nem a oposição conseguem se comunicar com a população, reconhecendo a atual situação e oferecendo saídas para a sociedade. Se enxergassem isso na oposição, a perspectiva seria a mudança de governo. A situação que aparece nas pesquisas do Data Popular é como se esses brasileiros achassem que os políticos querem derrubar a presidente Dilma porque querem o lugar dela e não porque querem melhorar a vida das pessoas”.
Como se vê, o povo não é bobo. Não está satisfeito com o governo, mas não vê a oposição como alternativa válida. Como diz Meirelles, “as pessoas não acreditam nos partidos políticos” e a sensação que ele tem é de que “os políticos não entenderam o recado de 2013”, ou seja, o recado das manifestações populares que tomaram o país: “O recado de que a forma de fazer e levar a política não representa mais os anseios do povo brasileiro. É como se o eleitor tivesse amadurecido muito mais rápido do que a sua classe política”.
Por isso, segundo Meirelles, “o maior problema não é do governo Dilma, é da classe política, que perdeu completamente a conexão com a população”, pois “está mais preocupada em desgastar o governo do que oferecer uma solução para a sociedade brasileira, apontar qual é a porta de saída da crise”.
Aí Meirelles trata de uma percepção que os políticos – e boa parte da imprensa – ainda não tiveram. A de que as pessoas dizem que querem o impeachment, mas nem têm uma compreensão clara do que seja isso, nem querem derrubar o governo. Há muita gente, a maioria da população, descontente com Dilma e com o governo. Mas a maioria dessa maioria não concorda com a visão de Estado dos políticos que querem derrubar Dilma.  “A maioria da população aprova os programas de distribuição de renda, políticas de redução de desigualdade, e os que se manifestam contra a presidente são contra. “O que divide oposicionistas e manifestantes daqueles que estão simplesmente descontentes com o governo é uma visão de país e sociedade. Não são as mesmas pessoas”.   
Quem não vive na redoma que é a Praça dos Três Poderes e seus arredores (incluindo jornalistas) sabe que Meirelles está certo. Ou melhor, que a maioria da população está certa. Esses políticos que hoje tomam a frente do processo de agravamento da crise e tramam a derrubada do governo, pelo meio que for, nada têm a ver com o povo, que está muito insatisfeito com o governo, mas sabe que a alternativa que se propõe é pior. Representam no máximo a parcela de direitistas exaltados, neoliberais saudosos e a elite poderosa economicamente, mas social e culturalmente vazia. Esses políticos não representam nem mesmo o empresariado de peso que, também descontente, quer soluções, e não demagogia rasteira.
Ou alguém acha mesmo que o Brasil sairá do buraco com Eduardo Cunha, Ronaldo Caiado, Renan Calheiros, Aécio Neves e assemelhados? Com esses, o que está ruim certamente vai piorar, e o povo sabe disso.
Helio Doyle
Brasil 247

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