Contra crise, Dilma deve avançar com reforma
Alguns dos 13 ministros que participaram da reunião deste domingo à noite com a presidente Dilma Rousseff e o vice-presidente Michel Temer saíram reclamando da falta de providências mais ousadas contra a crise política. Lamentaram a forte ênfase no diálogo sem qualquer referência a uma reforma ministerial que leve a uma repactuação político-partidária. Dilma, entretanto, não descartou (nem pode) o enxugamento dos ministérios e a mudança dos titulares. Apenas preferiu não tratar disso numa reunião tão ampla, o que fatalmente desencadearia uma torrente de boatos.
Mas tais ministros têm razão num ponto: crise é crise, e quem perde o timing pode ser engolido por ela. Apenas um presidente brasileiro, Getúlio Vargas, tinha o dom de empurrar as crises com a barriga até que, com o passar dos dias, como resumiu Gilberto Amado num texto célebre (transcrito por Lira Neto em sua biografia, tomo II), elas perdiam força como ondas e “desmanchavam-se a seus pés”. Dilma não pode demorar muito. Nem ela, nem ninguém, sabe exatamente o ponto de ebulição máxima da situação em curso.
Vamos por partes.
A reforma do governo – Em sua fala inicial na reunião, Temer voltou ao assunto de sua polêmica frase (“alguém que tenha a capacidade de reunificar a todos”), demonstrando que o problema do governo não está nele nem em suas supostas intenções. O problema é a falta de uma base para chamar de sua. Por isso teria sido enfático com os deputados. Ele desabafou, certamente precisava, mas ele devia sair de pauta agora.
Se o problema é a falta de base, diálogo apenas não vai mesmo resolver. Dilma estará com Temer nas reuniões que farão com cada partido, mas será preciso mais.
O enxugamento do governo terá efeitos fiscais (redução de gastos) e principalmente políticos.
Há duas duas propostas em discussão dentro do governo. Numa, são cortadas e/ou fundidas dez pastas, preservando-se aquelas que se relacionam com os movimentos sociais: Mulher, Negros, Direitos Humanos, Reforma Agrária etc. O governo passaria a ter 29 ministérios. Em outra proposta, passaria a ter apenas 23 ou 24. O corte é tecnicamente complexo e politicamente delicado mas o governo precisa avançar com a sua proposta. Depois viria a troca dos titulares.
A troca dos nomes – Definido o tamanho do ministério, a remontagem da base viria com a escolha de nomes que realmente possam garantir os votos no Congresso. Para começar, dois partidos anunciaram o rompimento com o governo na semana passada mas seus ministros continuam nos cargos. PTB e PDT. São casos bem diferentes. O ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Armando Monteiro, é do PTB mas, na votação da chamada primeira pauta bomba (aumento para a AGU e carreiras de elite do serviço público) garantiu o voto a favor do governo de três petebistas de seu estado (PE), afora, naturalmente, o de seu aliado Silvio Costa (PSC-PE), que é vice-líder do governo. Ademais, tem o apoio do empresariado da Indústria. Bem diferente é a situação de Manoel Dias, ministro do Trabalho: o PDT já vinha votando 100% contra o governo muito antes de anunciar o rompimento na semana passada.
Na troca de nomes, Dilma e Temer terão que discutir seriamente com os partidos a garantia dos votos. E à primeira falha, o ministro tem que ser fuzilado. De outro modo, tudo voltará a ser como hoje. Em governos de coalizão, em qualquer parte do mundo, é assim.
Situação na Câmara – Eduardo Cunha reagiu às críticas à irresponsabilidade fiscal da Casa alegando que ele, pelo contrário, até tentou ajudar mas o governo não tem base. Vale reconhecer que foi mesmo ele que segurou os destaques da emenda da AGU para o final do mês, dando um tempo para o governo reagir e quem sabe alterar a proposta através das emendas destacadas.
Mas a pauta bomba segue firme, e embora Cunha diga que o colégio de líderes é que a elabora, a maioria dos líderes lhe presta vassalagem. A próxima batalha será em torno do projeto que aumenta a correção dos recursos do FGTS. Depois, mais para o final do mês, o julgamento das contas de Dilma, com a apreciação do parecer do TCU. E talvez antes disso, a apreciação de vetos importantes, como o que altera a fórmula do fator previdenciário, o do aumento do Judiciário e o que garante a todos os aposentados o aumento do salário-mínimo.
Cunha deve manter-se na rota de confronto mas certamente registrou uma mudança importante na conjuntura. O reposicionamento das Organizações Globo, que deixaram de defender o impeachment e criticaram a irresponsabilidade fiscal da Câmara. Ele sabe que isso significa também o não-alinhamento com ele.
Aposta no Senado – Dilma investiu muito na obtenção de um mínimo de colaboração do presidente do Senado, Renan Calheiros, e parece estar conseguindo os primeiros resultados. Renan e Cunha têm origens políticas muito distintas e começam a se diferenciar. Esta semana Renan despachará a indicação de Rodrigo Janot para a CCJ avaliar e colocará em votação o projeto que reduz a desoneração da folha de pagamento de 54 setores da economia. A contragosto, pois o considera nefasto, mas não quer ser acusado de sabotar o ajuste fiscal.
Investindo também numa relação melhor com o conjunto de senadores aliados, Dilma recebe hoje todo eles no Alvorada, inclusive seus líderes. Se montar uma barreira no Senado, poderá deter ali pelo menos uma parte das bombas detonadas pela Câmara.
Mas, no curso de tudo isso, haverá os protestos do final de semana.
Tereza Cruvinel
Brasil 247
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