Na China, onde os chefes são considerados quase "intocáveis" por seus empregados, é difícil para que as pessoas se sintam à vontade para conversar ou até mesmo desafiar as ordens de seu superior.
Para tentar romper essa barreira que existe há séculos, o artista e designer Simon Ma costuma levar todos seus funcionários para um jogo de paintball. É a forma que ele encontrou de incentivar um comportamento mais aberto, que não surgiria espontaneamente.
Os 70 funcionários do seu estúdio de design em Xangai já são assíduos do campo de paintball – alguns possuem seus próprios uniformes e armas. A cada partida, Ma estimula que o tomem como alvo preferencial.
"Dia desses um auxiliar meu me falou: 'Você é meu chefe, mas nesse momento eu vou matá-lo'", diz Ma, aos risos.
O paintball não é só uma forma de aliviar o estresse no estúdio que é responsável pelo design de produtos variados – como relógios da Ferrari e da Hublot. É também uma forma de criar uma nova cultura de trabalho e de assegurar que os melhores funcionários sempre se sentirão a vontade e com confiança dos chefes.
"É mais um jeito de engajar os funcionários e fazê-los se sentir parte de uma equipe. Eles se sentirão menos compelidos a se demitir se tiverem essa sensação", diz.
Talento x cortes
Empresas geralmente precisam ficar reinventando formas de manter os seus melhores funcionários, mas poucas conseguem fazer isso com sucesso.No século passado, o tempo de permanência de pessoas na mesma empresa passou por uma grande mudança. Nos anos 1950 era comum que os funcionários ficassem na mesma companhia até a aposentadoria. Isso mudou radicalmente nos anos 1980, com uma reforma previdenciária que retirou todos os incentivos para que as pessoas se mantivessem presas a um emprego.
Por outro lado, as empresas sabem que achar, contratar e treinar funcionários é um processo muito caro, e que por isso é vantajoso ter programas para reter pessoas nos seus empregos, ou ao menos na corporação.
O professor de administração da Universidade de Hong Kong, Roger King, diz que não existe nenhum "grande segredo" para manter os funcionários na casa.
"Geralmente é preciso fazer o básico – tratá-lo com justiça e fazê-lo se sentir parte de uma equipe", diz King.
Para as pessoas que estão encarregadas de contratar funcionários, isso pode significar ter que desobedecer as ordens que vem de cima em tempos de bonanza. Nessas épocas, os diretores das empresas querem que gerentes contratem mais gente, mas nem sempre isso é uma boa ideia.
Igualmente, em tempos difíceis, os gerentes são pressionados a cortar funcionários.
"Gerentes precisam lutar como nunca quando seus chefes pedem para demitir gente", diz King. Para ele, as reduções de gastos só levam em consideração as necessidades do orçamento, e nunca o talento individual.
Mesmo que o gerente saia derrotado na sua luta contra o diretor, a briga ajudará a liderar o restante da equipe que fica na empresa.
"Se seu funcionário vê que você está lutando por ele, ele se sentirá confortável com sua liderança."
Exemplo brasileiro
O primeiro passo para lidar com pessoas que querem sair é ter uma conversa franca sobre os motivos da vontade de demissão. Especialistas acreditam que. na grande maioria dos casos, o salário quase nunca é o maior empecilho – o que falta é alguma motivação maior para continuar fazendo a mesma coisa.Para Chris Abraham, professor da escola S P Jan de administração, em Dubai, os motivos mais comuns são falta de autonomia na tomada de decisões ou a pouca compreensão que indivíduos têm do seu papel na organização.
Esse tipo de reclamação é algo que o empresário brasileiro Ricardo Semler, da Semco, conhece bem, segundo Abraham. A Semco permite que funcionários estabeleçam seus próprios horários, trabalhem de onde querem, escrevam resenhas sobre o desempenho de seus chefes e possam até votar em seus administradores.
Esse sistema ajudou a empresa de máquinas industriais a quadruplicar suas receitas em uma década, com faturamento superior a US$ 200 milhões. Mas um dos dados mais impressionantes da Semco que são estudados por professores como Abraham é o índice de "retenção" de funcionários: 99% dos mais de 3 mil funcionários seguiram na empresa nesse período.
"É possível ter uma empresa eficiente sem regras e controles", escreveu Ricardo Semler na revista de administração Harvard Review, em 2000. "É possível ser informal e criativo sem sacrificar os lucros. Tudo que se precisa é ter fé nas pessoas."
Não é para todos
Mas a cultura da Semco não funciona em todos os lugares. E gerentes que não estão no topo da estrutura de comando das empresas não têm poder para implantar esse tipo de padrão.Mas Abraham diz que todos têm condições de dar mais autonomia a seus empregados. Se sua empresa não permitir que você libere os empregados para trabalhar de casa, talvez ela aceite que você libere alguém mais cedo para pegar o filho no colégio. Ou talvez você possa permitir que um bom vendedor seu trabalhe mais horas em alguns dias, para poder acumular uma folga.
"Se você cria um bom ambiente de trabalho, as pessoas vão se orgulhar do que fazem. E se estiverem orgulhosas, é capaz de ficarem mais tempo no seu emprego", diz Abraham.
Esse ambiente que o designer Simon Ma esperava criar com seus jogos de paintball em Xangai. Ele também costuma levar os funcionários para noitadas na capital chinesa, para estimular um ambiente de descontração.
No entanto, recentemente ele teve que lidar com algo pouco comum. Depois de três anos no emprego, um de seus assistentes mais próximos se demitiu para trabalhar em outro lugar. Para o designer, isso serviu de lembrete de que é sempre importante fazer todos se sentirem parte de um projeto maior.
"É um compromisso. Não é só um trabalho das nove da manhã até as cinco da tarde. O dinheiro não é o grande fator de motivação. Talvez seja o segundo ou terceiro. [O primeiro] é sempre o objetivo ou se sentir parte de algo."
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