O ousado plano de Dilma na internet


Na esteira dos escândalos de espionagem, o Washington Post está dizendo que Dilma Roussef quer separar a internet brasileira da americana. O plano, ousado, segundo um texto publicado pelo blog americano Gizmodo, envolve construir uma nova ligação submarina por fibra ótica até a Europa para que as comunicações brasileiras não precisem passar por território americano, e obrigar as gigantes da internet a armazenar seus dados sobre brasileiros no Brasil, para que estejam sujeitos às leis brasileiras. O governo brasileiro também estaria estudando criar um endereço de email “@correios.gov.br”, para que os brasileiros tenham alternativa viável aos gmails e yahoos da vida.

Quanto à ideia de trocar o endereço de email, obrigado, eu passo. Por mais que eu confie no meu carteiro para me entregar cartas e, infelizmente, contas, não boto fé que os Correios sejam capazes de desenvolver um serviço melhor que o do Google.
Mas, para além disso, será que a preocupação de Dilma é mera paranoia? Será que é mesmo uma questão de “segurança nacional” manter o controle dos nossos dados?
Sem dúvida nenhuma os Estados Unidos têm um poder imenso em tudo o que se refere à internet. Natural: quase toda a internet que presta é americana. Por isso, mesmo que não houvesse espionagem do governo americano, os gringos já possuiriam uma bela vantagem estratégica sobre nós. Imagine que as empresas privadas dos Estados Unidos dispõem de uma imensa rede entranhada na nação brasileira, sugando informação e enviando para o norte todo dia. Essa informação toda vale dinheiro – muito dinheiro. Gigantes como Facebook e Google já faturam com publicidade em território brasileiro mais do que quase qualquer empresa local de comunicação.
Mas esse poder americano está baseado em bons produtos. Usamos o Facebook, em vez do Mirtesnet, porque o site funciona muito melhor, o que por sua vez se explica pelo fato de que a dinâmica economia americana foi capaz de investir o tempo de muita gente talentosa, formada nas melhores universidades do mundo, no desenvolvimento da rede social. Já o Mirtesnet provavelmente teve que lidar com altos encargos trabalhistas, insuficiência educacional, uma papelada enlouquecedora e, possivelmente, algum fiscal pedindo propina.
Quando ouço a notícia de que o governo brasileiro está prestes a investir uma fortuna para esticar cabos submarinos e erguer muralhas digitais, fico um pouco tenso. Será que tanta paranoia com segurança não vai acabar burocratizando nossa internet, enchendo a rede de pedágios e guaritas e catracas? Trabalho numa grande empresa e sei bem o que a preocupação com segurança não pode fazer com o humor de uma pessoa, que precisa decorar 17 senhas apenas para poder acessar seus emails.
De qualquer maneira, no mínimo algumas partes do plano de Dilma fazem sentido. Conectar o Brasil de maneira mais complexa ao grid digital mundial, de forma que nossas comunicações tenham vários possíveis caminhos a seguir, parece prudente. Dependência demais da internet americana deixa a nossa muito vulnerável e dá poder demais a um só país sobre informações cuja importância só vai crescer. É mesmo papel dos governos fornecer infraestrutura segura e de qualidade para os cidadãos poderem criar em cima dela – o surto americano de inovação digital só foi possível depois que o governo passou décadas criando superavenidas de dados.
Mas impedir cidadãos brasileiros de voluntariamente enviarem suas informações aos Estados Unidos me parece uma estratégia fadada ao fracasso e com vocação de nos deixar mais parecidos com países como Irã e China. O único jeito de evitar que a internet americana domine mais e mais aspectos da vida brasileira é criando no Brasil um ambiente tão dinâmico e inovador quanto o dos gringos. E, nesse aspecto, o governo muito ajuda se pouco atrapalhar.

Denis Russo Burgierman

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